Saber surpreender

A curiosidade foi mais forte. Tinha de experimentar. Comprei a compota de castanha e baunilha.

Adoro os dois ingredientes, por isso era uma combinação perfeita para mim. Na primeira oportunidade, abri o frasco e preparei-me para saborear o momento. Barrei uma fatia de pão escuro com aquele creme aveludado. Dei uma trinca pequena para degustar com tempo.

A compota era doce na dose certa. Consistente e macia, sem grumos. Sabia a castanha e cheirava a baunilha. Pode parecer esquisito o que vou escrever, mas era só isso e nada mais. Senti uma estranha desilusão.

Confesso que fiquei a pensar no assunto. Queria perceber o porquê da minha decepção com algo que, na teoria, seria delicioso para mim. Provei mais algumas vezes. E, quando menos esperava, descobri o motivo.

A compota de castanha e baunilha era aborrecida. Sabor, textura e aroma cumpriam os requisitos mínimos. Os ingredientes não foram trabalhados com o respeito exigido para despertar um UAU. Por isso não saciaram a minha gulodice, nem arrebataram o meu paladar.

No mundo da escrita também se encontram textos aborrecidos. São uma sucessão de frases bem escritas, mas sem ritmo, sem interesse e sem emoção. Sim, cumprem os mínimos exigidos. Mas é só isso e nada mais. Os leitores perdem o apetite e afastam-se.

No prato e na folha não pode haver espaço para o aborrecimento. É preciso apurar os conteúdos até alcançar a consistência desejada. O sabor tem de ser trabalhado com originalidade, bom gosto e um toque de irreverência.

É preciso escrever para surpreender e não para aborrecer.

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