A primeira vez
Posso não me lembrar de todas as minhas estreias. Mas aquelas que posso detalhar ao pormenor tiveram um convidado em comum: o nervoso miudinho.
Apareceu sempre, mesmo sem convite, e sentou-se na primeira fila. Bem instalado, mostrou-se pronto para a actuação.
Confesso que me senti intimidada em todas as ocasiões. Aquele olhar atento aos meus gestos e às minhas palavras. Preparado para, ao meu primeiro deslize, soltar a gargalhada. Claro que em pouco tempo tinha companhia. A ansiedade nunca se fazia rogada e juntava-se à festa.
O meu coração batia fora do compasso. Em total desarmonia com a minha razão. O medo de fazer má figura, de errar, de não conseguir. As dúvidas e as inseguranças brincavam às escondidas comigo. Deixavam-me desorientada e a minha confiança tremia.
A vontade de desistir, mesmo antes de tentar, era grande. Mas a minha curiosidade era maior e levou a melhor. Mesmo sem saber o desfecho, mesmo sem certezas nem garantias, avancei.
Respirei fundo, contei até 10 e fui:
Aprendi a andar de bicicleta.
Representei numa peça de teatro da escola.
Li em voz alta a minha composição para a turma.
Apresentei o meu trabalho de final de semestre.
Escrevi crónicas de jogos de: futebol, basquetebol, andebol, futsal, hóquei em patins e voleibol.
Troquei o jornalismo por um projecto editorial na área da música.
Entrei num avião com destino à Austrália.
Contei as minhas aventuras na terra dos cangurus num blogue.
Escrevi dois livros como ghostwriter.
Lancei a minha newsletter: Palavras {q.b.}.
Organizei o workshop ‘Escrever com Gosto’.
Ainda continuo a ir. Porque a primeira vez é uma aventura que nos faz querer mais.