Conforto
Papas de farinha de trigo. Filhoses com arroz branco. Fazem parte das minhas memórias afectivas. Ambas estão impregnadas do aroma da infância.
Farinha de trigo, açúcar, sal e água. Com apenas quatro ingredientes, a minha avó materna preparava-nos (a mim e à minha irmã) o melhor lanche do mundo e arredores. A suavidade daquelas papas era mágica. Aqueciam as tardes de Inverno, passadas em casa.
A festa ainda era maior quando ela nos fazia para o almoço as suas filhoses, acompanhadas de arroz branco. Sim, leram bem. Mas atenção, porque estas filhoses não têm nada a ver com as tradicionais do Natal. Eram uma receita dela: pequenas ‘nuvens’ fofas e douradas. Para a minha mãe era muito estranho aquele prato. Para nós era simplesmente perfeito. Foi a descoberta do delicioso contraste entre doce e salgado.
O tempo voa e eu continuo a recordar esses momentos, cheios de sabor, texturas e cheiros. Provei cozinhas do mundo, visitei restaurantes, experimentei ingredientes novos, testei inúmeras receitas. Mas não criei a mesma ligação emocional.
É engraçado como receitas tão simples estão cheias de significado para mim. Fazem-me sentir bem. Permitem-me viajar no tempo. São o aconchego ideal para os dias menos bons. Nutrem o corpo e a alma. É o poder da comida de conforto. É o amor no seu estado mais puro.
Porque menos é mais. Na cozinha, na escrita e, sobretudo, na vida.